"CARIOCAS"
Como
vai ser este verão, querida,
com
a praia, aumentada/ diminuída?
A
draga, esse dragão, estranho creme
de
areia e lama oferta ao velho Leme.
Fogem
banhistas para o Posto Seis,
O
Posto Vinte… Invade-se Ipanema
hippie
e festiva, chega-se ao Leblon
e
já nem rimo, pois nessa sinuca
superlota-se
a Barra da Tijuca
(até
que alguém se lembre
de
duplicar a Barra, pesadíssima).
Ah,
o tamanho natural das coisas
estava
errado! O mar era excessivo,
a
terra pouca. Pobre do ser vivo,
que
aumenta o chão pisável, sem que aumente
a
própria dimensão interior.
Somos
hoje mais vastos? mais humanos?
Que
draga nos vai dar a areia pura,
fundamento
de nova criatura?
Carlos,
deixa de vãs filosofias,
olha
aí, olha o broto, olha as esguias
pernas,
o busto altivo, olha a serena
arquitetura
feminina em cena
pelas
ruas do Rio de Janeiro
que
não é rio, é um oceano inteiro
de
(a) mo (r) cidade.
Repara
como tudo está pra frente,
a
começar na blusa transparente
e
a terminar… a frente é interminável.
A
transparência vai além: os ossos,
as
vísceras também ficam à mostra?
Meu
amor, que gracinha de esqueleto
revelas
sob teu vestido preto!
Os
costureiros são radiologistas?
Sou
eu que dou uma de futurólogo?
Translúcidas
pedidas advogo:
tudo
nu na consciência, tudo claro,
sem
paredes as casas e os governos…
Ai,
Carlos, tu deliras? Até logo.
Regressa
ao cotidiano: um professor
reclama
para os sapos mais amor.
Caçá-los
e exportá-los prejudica
os
nossos canaviais; ele, gentil,
engole
ruins aranhas do Brasil,
medonhos
escorpiões:
o
sapo papa paca,
no
mais, tem a doçura de uma vaca
embutida
no verde da paisagem.
(Conservo
no remorso um sapo antigo
assassinado
a pedra, e me castigo
a
remoer sua emplastada imagem.)
Depressa,
a Roselândia, onde floriram
a
Rosa Azul e a Rosa Samba. Viram
que
novidade? Rosas de verdade,
com
cheiro e tudo quanto se resume
no
festival enlevo do perfume?
Busco
em vão neste Rio um roseiral,
indago,
pulo muros: qual!
A
flor é de papel, ou cheira mal
o
terreno baldio, a rua, o Rio?
A
Roselândia vamos e aspiremos
o
fino olor de flor em cor e albor.
Um
rosa te dou, em vez de um verso,
uma
rosa é um rosal; e me disperso
em
quadrada emoção diante da rosa,
pois
inda existe flor, e flor que zomba
desse
fero contexto
de
metralhadora, de sequestro e bomba?
--Carlos Drummond de Andrade--
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