quinta-feira, 21 de março de 2013

"Homenagem à nossa Casa"



O Cântico da Terra

Eu sou a terra, eu sou a vida.
Do meu barro primeiro veio o homem.
De mim veio a mulher e veio o amor.
Veio a árvore, veio a fonte.
Vem o fruto e vem a flor.

Eu sou a fonte original de toda vida.
Sou o chão que se prende à tua casa.
Sou a telha da coberta de teu lar.
A mina constante de teu poço.
Sou a espiga generosa de teu gado
e certeza tranqüila ao teu esforço.
Sou a razão de tua vida.
De mim vieste pela mão do Criador,
e a mim tu voltarás no fim da lida.
Só em mim acharás descanso e Paz.

Eu sou a grande Mãe Universal.
Tua filha, tua noiva e desposada.
A mulher e o ventre que fecundas.
Sou a gleba, a gestação, eu sou o amor.

A ti, ó lavrador, tudo quanto é meu.
Teu arado, tua foice, teu machado.
O berço pequenino de teu filho.
O algodão de tua veste
e o pão de tua casa.

E um dia bem distante
a mim tu voltarás.
E no canteiro materno de meu seio
tranqüilo dormirás.

Plantemos a roça.
Lavremos a gleba.
Cuidemos do ninho,
do gado e da tulha.
Fartura teremos
e donos de sítio
felizes seremos.

Por Cora Coralina

Um Dia um tanto Drummond



A PUTA

Quero conhecer a puta.
A puta da cidade. A única.
A fornecedora.
Na Rua de Baixo
onde é proibido passar.

Onde o ar é vidro ardendo
e labaredas torram a língua
de quem disser: Eu quero
a puta
quero a puta quero a puta.

Ela arreganha dentes largos
de longe. Na mata do cabelo
se abre toda, chupante
boca de mina amanteigada
quente. A puta quente.

É preciso crescer
esta noite a noite inteira sem parar
de crescer e querer
a puta que não sabe
o gosto do desejo do menino
o gosto menino
que nem o menino
sabe, e quer saber, querendo a puta.

A triste polução foi adiada.

Por Carlos Drummond de Andrade

quarta-feira, 20 de março de 2013

Prazeres



Em mim te sinto, como chocolate quente, que envolve o meu corpo e me adoça, aqueces-me, despertas-me, nesta mistura de odores, que de nós emana, resultado de uma fórmula mágica de cheiros, única e nossa, inventada com os nossos fluidos, reinventada de cada vez que fazemos amor. Escorres entre os meus seios e, perdes-te entre os poros adocicados de ti, nascente de mel, que flui,  do carinho que me dás, quando a tua língua me saboreia e se cola a mim. Em nossas bocas não cabem os beijos, as palavras, e as doçuras derramadas de nossos lábios, agora perdidos em prazeres secretos, em instantes de dar e receber, recheados de deliciosas ternuras, sabores, e aromas agridoces, encontrados no momento, no limiar do desejo, quando as mãos se perdem, a pele se une, e a intensidade do prazer, impossível de abarcar, faz eco debaixo da tua pele, e se derrete dentro de mim.

--( autor desconhecido)--

"Capixaba da Gema"



Da chegada do amor

Sempre quis um amor
que falasse
que soubesse o que sentisse.

Sempre quis uma amor que elaborasse
Que quando dormisse
ressonasse confiança
no sopro do sono
e trouxesse beijo
no clarão da amanhecice.

Sempre quis um amor
que coubesse no que me disse.

Sempre quis uma meninice
entre menino e senhor
uma cachorrice
onde tanto pudesse a sem-vergonhice
do macho
quanto a sabedoria do sabedor.

Sempre quis um amor cujo
BOM DIA!
morasse na eternidade de encadear os tempos:
passado presente futuro
coisa da mesma embocadura
sabor da mesma golada.

Sempre quis um amor de goleadas
cuja rede complexa
do pano de fundo dos seres
não assustasse.

Sempre quis um amor
que não se incomodasse
quando a poesia da cama me levasse.

Sempre quis uma amor
que não se chateasse
diante das diferenças.

Agora, diante da encomenda
metade de mim rasga afoita
o embrulho
e a outra metade é o
futuro de saber o segredo
que enrola o laço,
é observar
o desenho
do invólucro e compará-lo
com a calma da alma
o seu conteúdo.

Contudo
sempre quis um amor
que me coubesse futuro
e me alternasse em menina e adulto
que ora eu fosse o fácil, o sério
e ora um doce mistério
que ora eu fosse medo-asneira
e ora eu fosse brincadeira
ultra-sonografia do furor,
sempre quis um amor
que sem tensa-corrida-de ocorresse.

Sempre quis um amor
que acontecesse
sem esforço
sem medo da inspiração
por ele acabar.

Sempre quis um amor
de abafar,
(não o caso)
mas cuja demora de ocaso
estivesse imensamente
nas nossas mãos.

Sem senãos.

Sempre quis um amor
com definição de quero
sem o lero-lero da falsa sedução.

Eu sempre disse não
à constituição dos séculos
que diz que o "garantido" amor
é a sua negação.

Sempre quis um amor
que gozasse
e que pouco antes
de chegar a esse céu
se anunciasse.

Sempre quis um amor
que vivesse a felicidade
sem reclamar dela ou disso.

Sempre quis um amor não omisso
e que suas estórias me contasse.

Ah, eu sempre quis uma amor que amasse.


--Poesia extraída do livro "Euteamo e suas estréias", Editora Record - Rio de Janeiro, 1999, Elisa Lucinda--

terça-feira, 19 de março de 2013

Música para recordar



Chuva de Prata
Compositor: Wilson Bastos / R.bastos

Se tem luar no céu retira o véu e faz chover
Sobre o nosso amor
Chuva de prata que cai sem parar
Quase me mata de tanto esperar
Um beijo molhado de luz sela o nosso amor
Basta um pouquinho de mel pra adoçar
Deixa cair o seu véu sobre nós
A lua bonita no céu molha o nosso amor
Toda vez que o amor disser vem comigo

Vai sem medo de se arrepender
Você deve acreditar no que eu digo
Pode ir fundo, isso é que é viver
Cola seu rosto no meu vem dancar
Pinga seu nome no breu pra ficar
Enquanto se esquece de mim lembra da cancão
Chuva de prata que cai sem parar

--Gal Costa--

quinta-feira, 14 de março de 2013

Ah! As mulheres...


Como mulher eu não possuo país. Como mulher, meu país é o mundo todo.”
Virginia Woolf



“As mulheres, durante séculos, serviram de espelho aos homens por possuírem o poder mágico e delicioso de reflectirem uma imagem do homem duas vezes maior que o natural.”
Virginia Woolf

“O preço barato do papel é a razão por que as mulheres começaram por ter êxito na literatura, antes de o alcançarem noutras profissões.”
Virginia Woolf

“A verdade é que eu sempre gosto das mulheres. Gosto da falta de convencionalismo delas. Gosto da integridade delas. Gosto do anonimato delas.”
Virginia Woolf

terça-feira, 12 de março de 2013

"Capixaba da Gema"



Escolha

Eu te amo como um colibri resistente
incansável beija-flor que sou
batedora renitente de asas
viciada no mel que me dás depois que atravesso o deserto.
Pingas na minha boca umas gotas poucas
do que nem é uma vacina.
Eu uma mulher, uma ave, uma menina…
Assim chacinas o meu tempo de eremita:
quebras a bengala onde me apoiei, rasgas minhas meias
as que vestiram meus pés
quando caminhei as areias.

Eu te amo como quem esquece tudo
diante de um beijo:
as inúmeras horas desbeijadas
os terríveis desabraços
os dolorosos desencaixes
que meu corpo sofreu longe do seu.
Elejo sempre o encontro
Ele é o ponto do crochê.
Penélope invertida
nada começo de novo
nada desmancho
nada volto

Teço um novo tecido de amor eterno
a cada olhar seu de afeto
não ligo para nada que doeu.
Só para o que deixou de doer tenho olhos.
Cega do infortúnio
pesco os peixes dos nossos encaixes
pesco as gozadas
as confissões de amor
as palavras fundas de prazer
as esculturas astecas que nos fixam
na história dos dias

Eu te amo.
De todos os nossos montes
fico com as encostas
De todas as nossas indagações
fico com as respostas
De todas as nossas destilairias
fico com as alegrias
De todos os nossos natais
fico com as bonecas
De todos os nossos cardumes
as moquecas.

--Elisa Lucinda--